terça-feira, 29 de setembro de 2015

BATE PAPO NA VARANDA

POSTO AQUI NO BLOG COMO RECEBI, JÁ DIGITADO, TRANSCRITO DA GRAVAÇÃO, CONFORME O COMBINADO COM OS AMIGOS:

(Agradeço a Ana Cury, por ter me poupado do trabalho da transcrição)
(Francisco Costa – 17/08/2013)

Esse bate papo faz parte de um acordo que fizemos com o Francisco Costa, ou Chico.
Ele nos daria uma entrevista na rádio, atendendo às perguntas dos ouvintes, por e-mail e telefone, e às nossas baboseiras, além de produzir a trilha sonora do programa, e faríamos uma outra entrevista com ele, sob tema específico – Facebook, para ser transcrito para o blog dele.
Ele relutou muito, já que só dá entrevista sob temas específicos e pouco gosta de falar de sua vida pessoal, afirmando que está tudo nas suas declarações públicas e nos seus textos, ficando preocupado com o que perguntariam os ouvintes.
Não foi possível fazer a entrevista ao vivo, na rádio, por causa da quantidade de pessoas que quiseram participar, mais de 20.
Fizemos fora de estúdio e colocamos no ar, após edição.
A contrapartida se deu na própria casa do Chico, na varanda de uma casa pequena, mas muito aconchegante, e fomos muito bem tratados, com comes e bebes que ele mandou comprar (ele mora só).
Chico é abstêmio, tomou suco de laranja durante todo o tempo, apesar de emendar um cigarro no outro.
Ele ficou sentado na rede, embora se levantasse a toda hora (ele usa o corpo todo para falar, gesticulando muito), e ficamos sentados no chão e em cadeiras.
O bate papo, integralmente:

Lena – Boa tarde, Chico. Vamos começar falando do Face, e trouxe dois amigos, também facianos e escritores, para participar.
Chico – Beleza. Ela eu já conhecia, ele não. Bem vindos ao meu barraco. Estou feliz de vocês estarem aqui, só não sei se a acústica é a mais adequada, se o micro vai captar tudo. O varandão é todo aberto porque preciso de ar quando trabalho com produtos químicos nos meus quadros, são tóxicos.

Lena – Chico, você se julga um facemaníaco?
Chico – Prefiro facelover (NR: amante do face), acho mais bonitinho. Sou sim.

Lena – Apesar da sua popularidade - a verdade é que você já conquistou um bocado de admiradores, você é novo de face.
Chico – Faço um ano agora em outubro. Essa popularidade que você fala é igual à de todos os que postam, são grupos fechados, quase todos nos conhecemos, senão pessoalmente, através dos trabalhos, dos comentários, das preferências nas curtições... Não é ilimitado, como no rádio. Na verdade é uma comunidade. Como posto mais e faço afirmações polêmicas, fico mais em evidência, o que não quer dizer que sou mais popular, e muito menos o melhor, longe disso.

Robson – Por falar em polêmica, você está suspenso do face...
Chico – Bloqueado, não suspenso. Eu continuo postando poemas e músicas. Estou impedido é de trocar informações. Me isolaram, bloquearam o chat, as mensagens e os comentários. Eu só recebo, não posso passar nada (risos), nem postar no mural dos amigos, só no feed e nos grupos.

Robson – O que aconteceu de fato?
Lena – O poema é lindo, a Ana me mostrou.
Chico – Mas não foi o poema que deu merda, foi a foto que o ilustrou, um peito lindo, uma foto altamente artística, pela concepção, pela técnica e pelo efeito... Aí alguém de alta sensibilidade e conhecimento achou pornográfico e dedurou à administração do face, e me bloquearam a comunicação.

Robson – Por quanto tempo?
Chico – Não me falaram, só afirmaram que é temporariamente... Minha mãe tem 88 anos e está aqui na Terra temporariamente, desde que nasceu (risos).

Lena – Você sabe quem foi?
Chico – Presumo, com noventa e nove por cento de chances.

Robson – Como?
Chico – Eu postei o peito. Imediatamente uma amiga veio no chat, afirmando que era muito cedo para eu postar aquela foto, que eu só podia postar depois das 20:30h. Respondi dizendo que no face não vale hora, que se eu a tivesse postado de madrugada e alguém comentasse, ela subiria, independente de horário. Ela disse que iria arranjar um jeito de contornar isso, mostrando que administra grupo mas não entende chongas de face. Conversamos mais um pouco e ela se despediu.
Logo no dia seguinte a administração do face me comunicou que havia uma denúncia de pornografia contra mim e que eu seria punido, liguei um fato ao outro e ela não estava on line no momento. Deixei um recado, agradecendo pela covardia. Uma hora depois ela entrou no meu chat tranquilinha, como se já soubesse. Ora, se alguém me acusa injustamente, viro bicho, qualquer um se irrita, e ela entrou calminha, calminha, negando o fato.
Postei imediatamente uma declaração aos amigos, narrando o que estava acontecendo, em todos os grupos, e começaram a pipocar comentários de solidariedade a mim e indignação com o que estava acontecendo.
Sintomaticamente, no grupo dessa senhora, o comentário da outra administradora foi o de que eu estava acusando os membros daquele grupo de serem dedos duros. Como, se não houve essa reclamação nos outros grupos e o texto foi o mesmo, colado em todos os grupos? Ela é que se sentiu atingida pelas minhas palavras duras. Essa não é minha amiga virtual.
A outra voltou ao chat e me pediu calma, que iriam contornar a situação. Ora, a única maneira de contornar, seria retirando a denúncia, e ficou tudo muito claro pra mim.
Como saí do grupo, em represália não retiraram a denúncia. E o face me isolou. Foi isso.

Lena – Mas o que motivou essas malucas a fazerem isso, Chico?
Chico – Sei lá. De repente complexo, têm os peitos no umbigo ou não foram devidamente mamadas ao longo da vida (risos),  ou é uma dessas putas com a virgindade restaurada por Jesus (risos. Chico está indignado). Porra, cara, eu odeio dedo duro. A deduração é a pior forma de covardia, porque você não tem chances de defesa. O dedo duro é abjeto, abominável.

Marcos – O face não investigou?
Chico – Acho que não, foi tudo muito rápido, não deu tempo. O face não fiscaliza o que é postado, o que é bom e é ruim. Isso é bom porque há realmente liberdade de postagens e comentários, mas é ruim porque não tendo controle sobre as páginas, não as fiscalizando, criam páginas de pedofilia, narcotráfico, incitação ao suicídio, terrorismo...
Como os membros dessas páginas são de círculos restritos, as informações contidas lá são pouco difundidas, dificilmente ficamos sabendo, o face também não, só tomando iniciativa de repressão quando denunciadas. Mas denunciar como, se são quase secretas? E na hora de punir não há critério, não importa se é pedofilia, tabela com preços de armas, maneira de fazer uma bomba caseira ou um peito, a punição é a mesma.
Cara! Conforme você falou, sou popular, de muita conversa no chat, pergunte a qualquer mulher qual foi o dia que digitei alguma coisa mais pesada, qual foi o dia que convidei alguma a se despir na webcam ou que insinuei sacanagens. Eu tenho mãe, irmãs, filhas, netas... Não sou do time que acha que nasceu com xereca é puta. Minhas filhas e minha irmã leem os meus poemas, minhas netas leem, minhas alunas e suas mães leem. Cara! Eu leciono a mais de quarenta anos, foram dezenas de milhares de adolescentes que passaram em minha vida, nunca pairou qualquer tipo de desconfiança sobre mim (Chico ameaça chorar e interrompemos o bate papo, para ele tomar água e se acalmar).

Retomamos: - Aí vem duas safadas que não têm o que fazer, pelos textos no chat e nas mensagens, sem condições nenhuma de escrever sequer uma cartinha pro amante, e põem a minha reputação em risco.
Eu não estou preocupado com suspensão nem bloqueio, meu chapa, vivi mais de 60 anos sem face, isso é supérfluo, preocupa-me é a imagem que construí durante uma vida inteira, em risco por duazinhas que nunca me viram, não sabem quem eu sou. É uma puta covardia!

Lena – Está mais calmo, Chico? Está esclarecido, vamos mudar de assunto: enquanto você saiu com os meninos, pra comprar os comes, eu a Ana e a Letícia estávamos conversando que você talvez tenha dado cara nova ao face e não tenha se dado conta disso.
Chico – Eu? Tá me superestimando!

Ana – Chico, sou bem mais antiga de face que você. Hoje há muito mais descontração nos comentários, muitos dos seu termos foram incorporados nos comentários de todos, você não percebeu?
Chico – Talvez eu tenha ajudado a mudar, mas não fui eu quem mudou. Quando cheguei era uma monotonia do cão (risos) a portuguesada com o bem haja, parecia carimbo, estava em todos os comentários, e os brasileiros com o agradecido, muito agradecido, carimbado também (risos). Aí saí tacando o eita, bom demais da conta, isso só é ótimo, tá danado... E o pessoal foi descontraindo nos comentários, deu uma aliviada, ficou mais agradável de ler.
Antigamente, ao ler um comentário eu já sabia se era um português ou um brasileiro que o tinha digitado, hoje já é mais difícil. Chupamos deles o que há de interessante lá e eles fizeram o mesmo conosco, exceto o brasileiro do interior e alguns portugueses que presumo estarem em rincões mais isolados. Esses são de linguajar mais conservador, pouco maleável.

Lena – E os africanos?
Chico – Aí complica, são mais difíceis de ser entendidos. Há alguma diferença na sintaxe e como, no face abreviamos muito as palavras, por causa da sonoridade dos fonemas na África, algumas frases com palavras abreviadas seguindo a pronúncia, a sonoridade, são ininteligíveis, tenho dificuldade, além do vocabulário. Há uma influência danada de dialetos locais, e que não chegaram a Portugal nem ao Brasil. Nas abreviaturas eles usam muito o x, o que pra mim é incógnita (risos)

Lena – Os vocabulários português e brasileiro são muito diferentes?
Chico – Não. Raras são as palavras que usam que não são usadas aqui, e vice versa. Algumas têm significados diferentes ou pesos diferentes, lá e aqui.

Robson – Dá exemplos pra gente, de significados diferentes.
Chico – Pra nós pica é um termo chulo, que significa pênis, lá é espinho. Então um amigo começou o poema dele: “Estou cheio de picas...”. No comentário coloquei: você é um abençoado, só tenho uma. A brasileirada deve ter rido muito, eles não entenderam nada, certamente. Mas faz sentido pica significar espinho, falamos picada de mosquito, picada de agulha de injeção...
Um outro exemplo interessante: se eu disser a você que estou com pressa porque vou para o rabo da bicha você vai entender que estou com pressa porque vou na bunda de um gay. Lá é ir para o final da fila (risos)
Mas isso acontece entre brasileiros também, por causa da nossa extensão territorial. Você vê um gaúcho conversando com um paraense e não parecem do mesmo país. Quando tinha congresso nacional do sindicato era uma verdadeira torre de babel, pelo vocabulário, pelo sotaque e pelos hábitos. Como sou observador, eu adorava observar isso.
Eu estava no chat conversando com uma nordestina, com a qual já tinha alguma intimidade, por causa das conversas continuadas, sobre vários assuntos, e, não lembro mais qual era o assunto, expliquei a primeira vez, a segunda vez, e nada da mulher entender, na terceira vez digitei puta merda!, com exclamação, que é uma expressão carioca bem típica, que traduz enfado, cansaço... A mulher recebeu o cão, entendeu que eu a chamei de puta e, para piorar, ruim, uma puta merda (risada geral).

Ana – (rindo muito) E como você contornou?
Chico – Eu pedi desculpas, expliquei o significado, acho que ela não acreditou muito, mas aparentemente aceitou.
Eu imaginava que o português de Portugal fosse muito diferente do nosso, não é.

Lena – Por quê?
Chico – Primeiro porque Portugal é pequeno, o que favorece a manutenção da língua, com pouca variação. O Brasil é imenso e se não bastasse isso, a influência dos índios e dos negros é enorme. Se você considerar que eram centenas, talvez milhares de povos indígenas ilhados, sem contato, essa influência indígena é muito variada e rica, principalmente na toponímia (NR: nomes de lugares, acidentes geográficos, bairros, ruas...) e a influência do negro também, já que vieram de pontos diferentes da África.
Mas não, excetuando as palavras estritamente indígenas, que não sofreram modificação e as africanas ligadas aos hábitos, como alimentação, no resto são quase que exatamente iguais.
Até o sotaque já não me incomoda ou dificulta.

Robson – Não? Eu tenho dificuldade.
Chico – Eu também tinha, mas os portugueses postam muitos vídeos, mais que os brasileiros, e o ouvido vai se acostumando. Também ouço rádios portuguesas, pela net. Então se hoje eu for a Lisboa dificilmente pedirei para alguém repetir alguma coisa, entenderei de primeira.
A uns dias atrás um amigo, o Fernando Bondoso, postou um vídeo onde ele declamou três poemas, dois dele e um de outro. Vi o vídeo uma única vez e pronto. A alguns meses eu teria que ouvir duas ou três vezes, para pegar as palavras que perdi, por causa do sotaque.
A minha imagem dos portugueses, depois do face, mudou muito.

Rogério – Mudou em que sentido, para melhor ou pior?
Lena – O Rogério falou! Pensei que só ia tietar (risadas)
Chico – Pra muito melhor, Rogério. Eu sou neto de portugueses, pelo lado materno, e de nordestinos, pelo lado paterno. Sendo que minha avó materna era filha de índia, e o vô paterno, negro nascido em senzala.
Aliás, uma homenagem a  vovô, a quem não conheci, quando eu nasci ele já tinha morrido: nascido em senzala, foi o primeiro negro na história do Brasil a se tornar advogado e, depois, juiz. Está registrado na história, chamava-se Francisco Costa, o meu nome é uma homenagem de papai ao pai dele.
Eu sou uma suruba racial (risos). Tenho o direito de ter todos os preconceitos, menos o racial.
Mas voltando ao assunto: nas grandes cidades, por causa do intercâmbio cultural, por estarmos abertos ao mundo, perdemos os preconceitos coloniais, até porque o opressor de hoje é outro, mas no interior, por falta de informações e tradicionalismo, as sequelas do colonialismo ainda são muito grandes.
O tronco paterno da minha família não gostava do tronco materno, os portugas, galegos, borduegas... E o tronco materno não gostava do paterno, os paraíbas... E eu cresci esquartejado nisso (risos).
Só de alguns anos para cá as piadas onde o personagem é burro, intelectualmente mal dotado, é a loura, por causa da música do Gabriel Pensador. Até então todo burro se chamava Joaquim ou Manoel, nas piadas (risos), era um português.

Rogério – Você considera isso um preconceito?
Chico – Não! É uma espécie de forra do colonizado sobre o colonizador, uma tentativa de depreciação. Nos Estados Unidos as piadas que depreciam intelectualmente são com personagens ingleses, os argentinos sacaneiam os espanhóis, nas piadas. É uma espécie de forra freudiana (risos)

Robson – E hoje quem é mais culto?
Chico – Pô, os portugueses, não tem nem comparação. Portugal é Portugal desde sempre, o Brasil, como sociedade organizada, existe a dois ou três séculos, o que em termos de história é ontem. Portugal é, culturalmente, um senhor. O Brasil nem adolescente é, nascemos ontem.
Para agravar, a nossa grande extensão territorial favorece uma grande variedade de manifestações culturais, mas dificulta um desenvolvimento em paralelo e concomitante, além da corja política que dificulta tudo e nos dá a penúltima educação do mundo, em qualidade.
Veja: como na Europa os países são todos pequenos e coladinhos, há um trânsito de idiomas danado. Boa parte dos meus amigos no face, além do português fala uma outra língua fluentemente, quando não mais que uma, o que é facilitado pela proximidade dos países de língua diferente. Aqui as nossas fronteiras ficam lá na caixa prego, é muito difícil o trânsito cultural e idiomático, a não ser nas áreas fronteiriças, e lá mora gente simples, que não tem interesses na cultura universal, só regional. Nas cidades litorâneas língua estrangeira só nos cursinhos, e com sotaque brasileiro (risos).

Lena – E o caráter? Você percebe diferenças?
Chico – Não. O caráter é pessoal, humano, e não varia em função disso ou daquilo. Você tem português bom e mau caráter, brasileiro bom e mau caráter, e assim com japoneses, africanos, americanos... Você tem gente de bom e de mau caráter entre católicos, budistas, protestantes, espíritas, ateus, umbandistas... O caráter é um atributo nosso, de cada um. O que varia nas sociedades e que pode ser modificado, tanto que o migrante modifica, para se adaptar, é a  personalidade. A personalidade é o resultado da influência do meio social sobre o caráter. Aí sim. Alguém que se converte a uma determinada religião muda a própria personalidade, mas não o caráter. Se é anjo ou filho da puta, continua sendo. Não é questão de deletar instintos, mas de manter o controle sobre eles.

Rogério – As personalidades, você vê diferença?
Chico – Aí sim. O homem português me parece mais doce, mais delicado, na maneira de ver o mundo e as mulheres, do que o brasileiro. O brasileiro é mais passional que o português, mais machista. Em contrapartida, a portuguesa é mais voluntariosa, mais autoritária, mais dura no se expressar que a  brasileira. Tem diálogos no chat, sobre qualquer assunto que, se eu te mostrar sem identificar quem está teclando comigo, você não saberá me dizer se é uma portuguesa ou um português. Mas é legal isso, diferente.

Rogério – Os africanos.
Chico – Acho uma delícia teclar com eles. Se há um adjetivo capaz de identificá-los é inocência. Você tecla com um negão daqueles e imagina que o cara tem 20 anos. Quando vai na página dele descobre que tem 45, 50 anos. Mas não se iluda, a história recente daqueles povos é de luta constante, de guerras contra o colonialismo, de resistência. São homens corajosos, de personalidades fortes... Falo é do se expressar, como se colocam diante de um amigo. Já as mulheres me parecem muito arredias, pouco vêm ao chat e são comedidas em comentários lá, entre eles. Pelas reclamações delas, nos comentários,  e a análise das entrelinhas dos poemas, o africano me parece ser ainda mais machista e autoritário que o brasileiro. Veja que é a minha opinião, não estou dizendo que é assim, é o que me parece, tanto para os portugueses quanto para os africanos, não sou antropólogo, é só opinião.

Lucas – E a mais gostosa? (risos gerais)
Chico – O Lucas falou, pensei que ele tivesse vindo só pra detonar a caipirinha (risos). Não sei, Lucas. Nunca comi uma portuguesa nem nunca comi uma africana (risos). Brincadeira, Lucas. Certamente você está se referindo à sensualidade delas. Veja bem, as nossas preferências estéticas são condicionadas, ditadas pela frequência com que as informações são passadas para nós. Até a alguns anos atrás o padrão de beleza feminina era a mulher batatinha, rechonchudinha, socadinha... Hoje é a magrela. Por quê? É magrela na televisão, nas capas de revistas, nos shoppings, nas vitrines... Então elas se emagrelaram e o gostoso, hoje, é roer ossos (risos). O homem tem na visão o principal sentido, e a mulher na audição, a evolução explica e justifica isso. Crescemos junto das negras e mulatas. Não se esqueça que a maior população negra do planeta está na Nigéria, e a segunda, no Brasil. Então os nossos padrões de sensualidade estão ligados à negra e à mulata, suas curvas, bundas grandes, seios pequenos... Então, para nós, são mais sensuais que as brancas.
Já lá, pelos mesmos motivos, as européias são mais sensuais, para os europeus, que as negras e mulatas, que eles adoram pelo exotismo, pela diferença, tanto quanto japonesas e tailandesas habitam o imaginário do homem ocidental, pelo exotismo.

Lena – Descasca essa de o homem ver e a mulher ouvir.
Chico – O que provoca mais ciúmes em você: uma mulher linda, gostosona e burra assediando o teu marido ou uma intelectual feia pra cacete? Agora me pergunta o que me incomoda mais, um cara lindão e jumento na orelha da minha mulher ou um feinho inteligente pra cacete? Homem come o bonito, mulher dá para o sensível e inteligente.

Lena – E é aí que você faz a farra (risos)
Chico – (visivelmente envergonhado) Você é muito boba (risos)

Ana – Mas tem uma tietagem danada em volta de você...
Robson – Ana está com ciúmes!
Ana – Deixa de ser babaca, sujeito. Conheço o Chico a mais de quinze anos. Se não rolou não é agora que vai rolar...
Robson – Deglute agora ou embrulha, Chico?
Chico – (incomodado, pensando muito antes de falar) Não é bem assim...

Ana – Cai na real, Chico. Eu vejo os comentários aos teus poemas, no face, imagino o teu chat... Você coloca a voz no microfone e o telefone da rádio entope... Quando as mulheres ficam sabendo que somos seus amigos ficam perguntando sobre você, como você é... Pára de ser cínico e fala, anda logo!
Chico – (rindo muito) Já curti muito isso, no passado, e aproveitei, claro. Hoje tenho os pés no chão. No face, algumas confundem poema e poeta, e no rádio... Associam a minha voz ao repertório que escolho pra tocar, às baboseiras românticas que falo... Então o assédio não é a mim real, mas ao que elas idealizam. Cada uma tem um Francisco Costa diferente na cabeça. Por ter consciência disso, pouco me motivam, sem contar que estou nos sessentinha, não há mais a disposição de outrora. Elas leem ou me ouvem declamar um poema erótico e associam, sem se tocar que aquele tesão todo morreu em meados do século passado (risada geral).

Letícia – Você não aparenta ter a idade que tem.
Chico – Ué, a Letícia sabe falar? Pensei que fosse a mulher ideal, muda (risos)
Letícia – (brincando) Machista nojento!
Lena – A gente escuta aquele teu vozeirão na rádio ou lê um poema de enorme virilidade e imagina um sujeito de um metro e noventa, surfista (risos), saradão... E quando chega perto... Qual é a tua altura, e o teu peso?
Chico – Um metro e sessenta e oito e cinquenta e cinco quilos. Já pesei quarenta e oito, na época da ditadura. Miudinho e magrelo, só voz e raiva (risos).

Letícia – Eu vou insistir porque essa é uma curiosidade geral, já que ou as pessoas só te escutam, no rádio, ou só te leem: além disso que a Letícia falou, há uma outra contradição: você é áspero, rijo, quando no discurso político, já dirigiu sindicato, fala pra multidões, faz muito uso de palavras duras... Mas tem corpo de menino, olhar de menino, gestos de menino... A gente parece que está conversando com um garoto.
Chico – (rindo) O mesmo papo da minha mãe: “você parece que não cresceu, meu filho”. Um dia desses a mãe do meu filho, quando cheguei com ele, falou: “de longe a gente não imagina a idade que você tem, parece adolescente, só percebe de perto, quando olha pro teu rosto”. O constante exercício físico nas hortas, na granja... Eu nunca fui fisicamente inativo, e a cor da pele me conservaram. Rugas só no rosto, e por causa do tabagismo.
Letícia – E não tem barriga, está tudo no lugar.
Chico – (rindo) Quer? Mando por Sedex.

Robson – Cor da pele?
Chico – Sim. O maior fator de envelhecimento é a luz solar. Aliás, os dois maiores aliados da vida, os responsáveis pela vida são a luz do sol e o oxigênio. Contraditoriamente, os maiores inimigos da vida são o sol e o oxigênio. A oxidação excessiva cria os radicais livres em nosso organismo e o sol em excesso desidrata e cancera, os dois são fatores de envelhecimento e morte.
O homem é produto de uma evolução, como todo ser vivo, e a cor da pele está determinada por um pigmento chamado de melanina, que é um isolante térmico e ótico. Quanto mais melanina, mais isolado está o corpo. Quanto menos, mais exposto à luz e ao calor do sol.
Se você reparar, a humanidade começou nos oásis e periferias de desertos, em regiões intermediárias, entre os desertos e as florestas, nas pradarias, nas estepes... E nas savanas, principalmente,  que são regiões pouco arborizadas. Então desenvolveram muita melanina, para proteger da insolação. Os povos mais antigos são negros ou quase negros. É só ver.
Já o Europeu é de área de pouca insolação, com os raios solares já quase tangenciais, têm pouca luz e calor a disposição, então nada de melanina, para absorver o máximo de luz e calor possíveis.
Intermediariamente temos os índios, que vivem em áreas fortemente arborizadas, alternando luz e sombra, o que lhes permitiu ter uma quantidade intermediária de melanina.
Como as cidades, pelo jogo de luz e sombra, se assemelham a uma floresta, as edificações funcionando como copas de árvores, os de pele indígena estão melhor adaptados, envelhecendo mais lentamente. É isso.
Se você levar um adolescente alemão para a África, quando ele tiver 40 anos, estará com o aspecto de 60. O mesmo com um negro na Europa.
Basta um ventinho e o criouléu se agasalha (risos), está um frio do cacete e os brancos de peito nu, ou então, esquenta e os branquelos derretem, já os negros trabalham o dia todo, de peitos nus, quebrando pedras, no sol, numa boa. Adaptação ecológica. A extrema burrice é o homem fugir da sua condição de animal, querendo ser Deus.

Letícia – Você usa os termos negro, negão, crioléu... Não tem medo de ser mal interpretado?
Chico – Claro que não. Na hora em que eu começar a escolher palavras é que estarei discriminando. Esse negócio de politicamente correto é de uma hipocrisia que chega a nos insultar. Chamar de negro ofende, tem que ser afrodescendente. Porra, isso não define nada. Se uma loura nascida em Angola ou Moçambique migra para o Brasil e se casa com um louro brasileiro, devo chamar os seus filhos de afrodescendentes? Porque geneticamente são. Então afrodescendência não define cor de pele. Isso é coisa de racista. Como não podem mudar a cor dos negros, mudam a denominação, para doer menos nos ouvidos. Porque não propõem chamar os brancos de eurodescendentes? Quem não tem preconceito não tem medo de palavras. Chamo minhas filhas de gorduchas, gordinhas, bolotas e não as amo menos por isso, não as tenho por melhores ou piores por serem gordinhas, ou vai aparecer algum babaca dizendo que pratico bulling?
É igual a favela, palavra politicamente incorreta. Como não têm competência nem vontade política para acabar com as favelas, acabam com o nome, agora é comunidade carente. E Copacabana, devo chamar de comunidade opulenta? O politicamente correto é o preconceito travestido.
Negão, criouléu, neguinha, gorducha, baixinha, branquelo, portuga, japa,... Como sou magrelo, baixote, tagarela... Intimidade e carinho. Vão ser policialescos na pqp! (risadas)
Outra coisa é chamar de preto, aí ofende. Preto é ausência de cor. Chamar um negro de preto é o mesmo que chamar um branco de desbotado. Meu avô era negro, tenho sangue negro, com muito orgulho, sou meio negão e ponto final. O resto é teorização de viadinhos.Pior ainda é “cidadão de cor”. Quando ouço isso tenho ânsia de vômito. Porra! Cidadão de cor... Qual? Verde, azul, rosa? (risos) É negro mesmo e ponto final.

Lena – Acho que essa laranjada está te embebedando (risos)
Chico – Não, é indignação mesmo! (risos)

Ana – Você acredita em sentimentos virtuais?
Chico – Não. Não existe uma realidade virtual. A realidade virtual nada mais é que um feixe de informações, um fluxo de impulsos elétricos. Sem cérebro não pode haver sensibilização dessas informações. Elas podem até ser trocadas entre máquinas, interpretadas pelas máquinas, mas de maneira fria, algorítmica. Acredito é em sentimentos a partir de troca de informações pela via virtual, à distância.

Ana – Que tipos de sentimentos?
Chico – Muitos. Por exemplo, eu fiz amizades com pessoas em Portugal que prezo como se fossem velhos amigos, tenho uma curiosidade enorme de conhecê-los pessoalmente, mas não só para vê-los, para ser amigo mesmo, partilhar altas conversas, fazer confidências... Viraram amigos mesmo.

Ana – Me explica como é o mecanismo dessa amizade, como nasce isso, a partir de quê?
Chico – Pela observação, partilha de interesses e gostos, posicionamentos... Você começa a observar os poemas dessa pessoa, adivinha-lhe o caráter, o posicionamento político ideológico, a religiosidade ou não, se identifica com o estilo de escrita, observa que ele curte e compartilha mais ou menos o mesmo que você, seus comentários aos poemas dele são simpáticos, os dele aos seus, também, tudo isso com sinceridade... Acaba havendo uma espécie de envolvimento afetivo, você passa a nutrir sentimentos que são mais que só admiração, coisa de amigo mesmo.

Lena – Amor é possível?
Chico – Não. Paixão sim.

Lena – Gostei. Explica.
Chico – A paixão é idealizada, vive no âmbito das suposições e esperanças, dos sonhos. Nos apaixonamos pelo que nos falta. Já o amor é concreto, tem cheiro, corpo de carne, sexo. Você pode se apaixonar por uma pessoa a partir de uma amizade que cresce, você vê no amigo ou na amiga qualidades que você desejaria presentes na pessoa amada, que compartilhasse o dia a dia contigo e cria uma dependência afetiva, uma necessidade, mas não é amor. Não se ama fotos,  poemas, senão vamos cair na situação dos adolescentes que dizem amar os seu ídolos.
Agora, se a partir de uma paixão os apaixonados se conhecem de fato, no mundo real, toda aquela ânsia de conhecimento, aquela necessidade de ter de verdade, pode se tornar substrato de um amor duradouro, com certeza. As chances são muito grandes.

Ana – Para a poesia, não para os poetas, para a poesia, o que há de bom e de ruim nos grupos de poesia?
Chico – De bom há que é uma vitrine para mostrarmos o nosso trabalho, o que gera influências recíprocas, as vezes uma certa competição, e aí a galera se esmera, força barra pra se superar, e quem ganha com isso é a própria poesia, que sobe de nível. Quanto mais poemas maiores as possibilidades de mais e melhor poesia. É a dialética: a quantidade gera a qualidade.
Outra coisa boa é que você concentra obras poéticas num universo restrito e de fácil acesso, senão teria que correr livrarias, manusear livros... Para namorar a poesia.
De ruim é o imediatismo. Acho que todos os poetas entraram na roda viva do digitar e postar, inclusive eu. Isso é horrível. Terminado, um poema tem que ir para a gaveta, maturar. Quando você está quase esquecido dele, você retoma, relê com olhar crítico, como se aquele poema não fosse seu e vai mexendo, aprimorando, melhorando-o. Tem poema do Drummond que ele levou oito meses para concluir. Repare que quase todos os poetas famosos quando morrem deixam trabalhos inéditos nas gavetas, é o que estava maturando. Não é por outro motivo que quando publicados, na maioria das vezes geram polêmica dos críticos.
Os poetas do face não deixam passar pela maturação, postam logo. Você acredita que já digitei poema diretamente no feed, postei, automaticamente, e só depois copiei e colei nos grupos, pra depois copiar novamente num grupo e colar no meu blog? Olha que loucura! Isso prejudica o nível das postagens, lógico.

Letícia – E para o poeta?
Chico – Os homens não falam nada. Enquanto as garrafas não secarem ficarão com as bocas ocupadas (risos)
Robson – Tua caipirinha tem alta dose de poesia (risos)
Chico – E não bebo, ein! Faço sem experimentar. De bom para os poetas é a alimentação da vaidade, todo artista é vaidoso, o que nos obriga a escrever cada vez mais e melhor, em permanente tentativa de superação, e a vitrine do nosso trabalho, que fica ao alcance fácil de editores e editoras.
De ruim é o risco de plágio e apropriação indébita. Se plagiarem nos grupos ou se praticarem apropriação indébita nos grupos, a gente pega e desmoraliza, como já aconteceu mais de uma vez, mas... No domingo passado chamei a mãe do meu filho caçula, que passaram o dia comigo, foi dia dos pais, e mostrei um comentário em árabe a um poema meu, ela pode confirmar. Já comentaram em inglês, várias vezes, em alemão. Se não comentaram em português, é porque não sabem português. Se gostaram do poema é porque leram na língua deles, provavelmente usando o tradutor do Google. Perdi o controle sobre os meus poemas, nada impede que um maluco traduza os meus poemas para uma língua qualquer e publique em livro no nome dele. Esse é um risco real e grande. A questão não é de registrar porque, ainda que registrado, como você vai saber que foi roubado na Alemanha, no Egito, no Japão?
Meus poemas, em português ou não, estão nos murais pelo mundo todo, já que temos amigos espalhados em tudo que é canto e colam e compartilham os nossos trabalhos, sem contar que amigos dos amigos, e que não são amigos nossos, compartilham de murais, espalhando a porra toda. (risos) Estou colocando eu por um acaso, isso acontece com todo mundo que posta no face.

Letícia – Não entendi bem.
Chico – Imagina que eu goste de um poema teu e compartilhe. Vai para o meu mural. Minha filha vê no meu mural e compartilha. Você não conhece a minha filha. Aí um amigo da minha filha vê no mural dela e compartilha. Eu não conheço esse amigo dela e nem você; aí alguém copia desse cara e vai indo toda vida, a gente perde o controle, entendeu?

Lena – Bom, Chico, chegamos na tua praia, que é escrever. Você tem dois números invejáveis:
mil poemas escritos em menos de dez meses e onze mil acessos no blog em dois meses. Isso dá uma média de três poemas escritos por dia e duzentos acessos por dia, um cada cinco minutos,no seu blog, é muito leitor. Fala alguma coisa sobre isso.
Chico – Eu sou escritor compulsivo. Na época da caneta e papel. Eu tinha uma caneta e papel na mesinha de cabeceira, na sala, em meu gabinete, no atelier, no carro... Eu já parei o carro no acostamento, para escrever. Agora a máquina fica ligada o dia todo. Bateu alguma coisa eu clico no Word, que já está aberto, só minimizado, e começo, antes de esquecer. Tem dia que não escrevo nada, as vezes dois três dias sem nada, de repente vem oito, dez poemas, um atrás do outro. E também não preciso de recolhimento, concentração, posso escrever numa festa ou agora, conversando com vocês, embora os melhores sejam quando estou só, recolhido.

Lena – Você se inspira assim facilmente?
Chico – Não sei como vou responder isso. Não sei o que é inspiração, ninguém sabe, o que há é uma compulsão à escrita, uma vontade incontrolável de escrever, e você escreve.

Ana – E como vem essa necessidade, do nada?
Chico – As vezes sim. Você senta e fica olhando pra tela, esperando a ideia chegar, e chega. As vezes aparece uma palavra na tua cabeça, uma frase, aí você senta e desenvolve o tema. Pode também acontecer de você se induzir, se colocar inspirado, basta querer, estar a fim de escrever, mas sem ideias.

Ana – Como?
Chico – Tem determinadas músicas que te induzem, algumas ideias recorrentes, aí você se concentra nelas, e jorram ideias novas.

Ana – Me desculpe, Chico, mas isso está parecendo psicografia, coisa de Chico Xavier.
Chico – Também já me questionei sobre isso, as vezes escrevo poemas que são estranhos pra mim mesmo, é como se não tivesse sido eu o escritor, mas como não pratico o espiritismo, não cumpro nenhum ritual de concentração, essas paradas, acho que é coisa de subconsciente mesmo, coisas que estão em mim e saem. No passado eu fui leitor compulsivo, de ler dez, doze horas por dia, então eu tenho muita informação armazenada, que se reorganizam na forma de textos novos, em prosa ou poemas. Eu vejo por aí.

Ana – Faz sentido. Você dá opinião em tudo, se posiciona em relação a tudo e sempre de maneira inteligente, muito respeitado. Você tem um outro blog. Além de poemas você também escreve prosa.
Chico – Sim. Escrevo contos, crônicas, novelas... No meu blog de prosa, esse onde vou postar essa entrevista, tem um romance, Não Haverá Mais Natais, que é autobiográfico, e mais uns contos e crônicas.

Letícia – Você também tem uma coisa interessante, você é um frasista de mão cheia. Conversando, você solta umas frases que, retiradas do contexto, são pérolas. Ainda a pouco mesmo você afirmou: “eu sou uma suruba racial”. Você anota essas frases?
Chico – Não, nunca anotei, elas saem naturalmente, não são previamente pensadas. Quando eu era adolescente e fazia afirmações que provocavam admiração, eu inventava. Me perguntavam quem era o autor e eu chutava: Nietzche, Schopenhauer, Jean Jacques Rousseau... Quanto mais difícil a pronúncia do nome do sábio, mais eu o citava como autor da baboseira dita por mim (risos), para impressionar. Impressionava. Renderam alguns namoros e respeito dos colegas (mais risadas).

Lena – Outra coisa: os poetas, não só os poetas, os escritores, de uma maneira geral, se prendem a uma temática, em você tudo é motivo para poemas, nada te escapa. Fala sobre isso.
Chico – Sou um homem do meu tempo, e não estou imune a nada. Se eu falasse só dos meus chifres, dos meus amores, eu seria limitado. Veja: acontecem os fatos. Cabe ao jornalista registrá-los. Depois vem o historiador, para sistematizar, formar ideia e opinião, mas sempre no campo material, da aparência, de como se deu, e pronto. Cabe aos artistas, através das suas obras, seja música, um quadro, uma escultura, um texto... Captar e passar o fato pela ótica dos sentimentos, que não é atribuição do jornalista, mas do artista . Cadáveres na esquina devem ser noticiados pelos jornalistas. O porque disso deve ser encontrado pelo historiador, e o que sente os envolvidos e a sociedade, por causa disso, quem descreve, ou pelo menos especula, é o artista. Sem querer me comparar, lógico, todos os grandes poetas agiram assim, e tiveram essa função histórica.

Marcos – Faz a ele aquelas perguntas que ele adorou no rádio (risadas)
Chico – O Marcos já migrou para o umbral do etilismo, porrou (risos). Está pedindo aquelas perguntas que as tietes fazem ao Michel Teló e Luan Santana. Pega aí a régua e vem cá medir, neném, deve ter gente interessada na informação (risos)
Robson – De repente ele mesmo. Ele vai adorar fazer isso. (risos) Com carinho, ein, Marquinhos.
Chico – Ô baixaria. Botar isso no blog vão pensar que tinha maconha na minha laranjada (risos)

Ana – Marquinhos e Robson, comportem-se senão vou sumir com essas garrafas.
Marcos – O Chico gosta de escrever e de mandar beijão. Eu gosto de mulher e de caipirinha. Qual é o problema? (risos)
Letícia – Queima, Senhor! (risos)
Chico – Com as brasas do inferno, (mais risos) A isca do verdadeiro amante é a discrição. Esses que dizem como todas, acaba só comendo caipirinha com empada de camarão (risos).
Ana – Boa!
Chico – Agora vamos retomar numa boa, senão vou romper o compromisso de publicar na íntegra, vou tirar essas babaquices que a gente está falando.

Ana – Você disse a uns dias atrás que estava pretendendo criar mais blogs.
Chico – Sim. Pretendo criar mais dois. Um para postar as fotos do meu trabalho plástico e outro para postar música.

Ana – Suas?
Chico – Não, quem dera! Eu não tenho a menor competência musical, a criatividade musical está para mim como os passarinhos estão para os aquários, nada a ver.

Robson – Vai ter Luan Santana e Michel Teló?
Chico – Vai. Vai ter também muito funk, pagodinho, gospel, forró com letra pornográfica... O supra sumo da arte musical brasileira, coisa de dar inveja no Tom Jobim. (risos). Sem sacanagem: tem muito lixo na internet, lixo porque coisa boba, descartável, e lixo porque mal gravado ou mal editado. Então pretendo selecionar o que presta, seja pela música, seja pela qualidade visual do clipe, e dividir em pastas: baladas românticas, MPB, Jovem Guarda, Festivais, rock nacional, rock internacional.

Lena – Você já tem isso no seu computador.
Chico – Já, mas pouca coisa. Tenho que procurar mais, selecionar.

Lena – Eu andei dando uma fuçada... Você tem mais pastas interessantes.
Chico – Tenho mais três pastas. Uma que é o meu jardim botânico virtual, principalmente com cactáceas, suculentas e flores, com tudo catalogadinho: nome científico, classificação, local de origem... Uma que é o meu jardim zoológico virtual, com ênfase em aves e répteis, que eu adoro, também com as informações de cada espécie, o que a galera posta aí nas páginas e copio. A terceira é de imagens de arte digital, que acho lindas, mas não domino, nem conheço sequer, a técnica para fazê-las, coisa de Photoshop. É isso.

Lena – Você tem muita foto!
Chico – Tenho. Só de bicho e planta deve ter mais de dez mil.

Marcos – Estou bêbado mas vou fazer uma pergunta inteligente: você tem zoológico virtual, jardim botânico virtual, posta um monte de poemas, vai ficar com 4 blogs, é membro de uma porrada de grupos de poetas, grupos de filosofia, de música... Que mais? Comenta e curte o dia todo, deve ter namorada no face, escuta música na net... Você não acha que está virtualizando a tua vida, saindo da real? (palmas)
Ana – São padroeiro da lucidez, obrigado pela graça alcançada!
Chico – (rindo muito do que a Ana disse) Talvez. Eu sou sozinho. Até a pouco eu me dedicava ao sítio, aqui, mas, por causa da minha idade, está ficando cansativo e frustrante. Frustrante porque quando não consigo mais fazer alguma coisa, porque falta força ou bate o cansaço, fico revoltado, as vezes com vontade de chorar.  Aí troco a atividade física pela atividade mental. Uma amiga moçambicana, mas que vive em Portugal, já me chamou a atenção pra isso. Isso não me preocupa.

Lena – Você não namora?
Chico – Claro que namoro. Tô vivo!

Marcos – Toma viagra? (risos)
Chico – Não, amor. Sou enfartado, há o risco de eu morrer em cima de você. (risos continuados, Marcos fica corado, sem ter o que dizer)
Ana – Bem feito! Quem mandou encher a cara de cachaça? (risos)
Chico – Sacanagem, Marquinhos. Eu sou enfartado. Remédios que aumentam a pressão arterial são contra indicados, são de risco. Sou tão azarado que os velhinhos da minha geração vão trepar até os cem anos, pra mim na hora em que parar, parou (risos)

Ana – Vamos falar de coisa séria? Pára com a bobeira, Marquinhos. Quando começaram as passeatas, você jogou o teu peso todo, acho até que chegou a organizar e liderar algumas...
Chico – Uma só. Nas outras fui só participante, mais um na multidão, mas com o mesmo orgulho.
Ana – E de repente jogou a toalha. Por quê?
Robson – Chico é o Guevara brasileiro!
Chico – E o Robson, o Tiririca na entrevista (risos) (NR: Tiririca, palhaço de circo e da televisão, analfabeto, foi eleito deputado federal com a maior votação do país)
Robson – Melhor ser Tiririca que Feliciano, a deputada que não gosta de mulher, de viado e de preto, só de Jesus (risos)
Chico – Vamos parar, esses caras já porraram. A gente continua outra hora.
Lena – Tá vendo o que vocês arrumaram? Não sabem beber...
Robson – Continua, Chico, a gente vai ficar calado, eu juro.

Ana – Porque você recuou das passeatas?
Chico – Sou coerente, Ana. Quando o movimento começou percebi imediatamente três coisas: primeiro: era um movimento apartidário, nascido nas redes sociais, sem direção, por puro voluntarismo, e vi nisso uma possibilidade nova na política brasileira, talvez mundial; segundo: a reivindicação era pontual, os preços das passagens, que imaginei ser o primeiro degrau de reivindicações outras, depois, e não tudo de uma vez, de maneira abrangente, e que se perde justamente pela falta de objetividade, o que sempre fizemos, e; terceiro, que não havia caras conhecidas, raposas velhas se aproveitando da situação. Então como embrião de uma coisa maior, perfeito.
Mas logo nas primeiras passeatas comecei a perceber alguns equívocos, que imaginei que seriam superados logo depois, e não foram, abrindo uma brecha danada para forças conservadoras se manifestarem e, pior, conspirarem contra a democracia e o poderes constituídos, com os quais quase nunca concordo, mas respeito, não há nada melhor que a democracia.

Ana – Fala desses equívocos.
Chico – Quando começaram a expulsar os partidos das manifestações, entendi como um fato positivo, para não permitir direcionamentos, oportunismo, aparelhamentos... Mas na esperança que, depurado o primeiro momento, o negócio fosse se partidarizando. O único canal político é o partido político. Assim como para entrar no mundo virtual eu tenho que usar o meu computador, para influir diretamente sobre o poder, apoiando ou fazendo oposição, o único canal é o partido político, senão tudo se esgota nas ruas, como se esgotou.
Segundo que um grupo notoriamente anarquista e, pior, internacional e conservador, começou a crescer num ritmo muito rápido para o meu gosto. Quando levantaram a bandeira anticorrupção achei sensacional, e era por aí mesmo, em todo o espectro, da extrema direita à extrema esquerda, passando pelo estômago do governo, sem perdoar ninguém, tudo que é filho da puta, independente do matiz político, na cadeia, mas centraram-se no governo só, aliviando as quadrilhas tucanas, do Dem... Deletando tudo que é falcatrua que não tivesse sido cometida nos governos Lula/Dilma, e aí percebi golpe em andamento, para serem substituídos pela direitona. Aí não só tirei o time como passei a denunciar.

Lena – Fala um pouco desse grupo, que teve um papel enorme nas manifestações e no vandalismo e que a imprensa, cúmplice da direita, não comentou.
Chico – De todas as filosofias políticas a mais utópica é o anarquismo. A humanidade já tentou diversos tipos de estruturas sociais e econômicas, que se implantaram, foram duradouras, e só terminaram quando substituídas por outras, melhores. Só o anarquismo não foi usado, só foi tentado em grupos restritos, e que não deu certo. Desde Proudhon que o anarquismo se mostrou uma impossibilidade. Se no passado, com as sociedades estruturadas de maneira mais simples não deu certo, que dirá hoje, com a instantaneidade de informações, um fluxo de mercadorias e moeda rapidíssimo... É uma utopia, uma piada filosófica.

Ana – Você não acha que a organização por células, como propõem, tem um pouco a ver com o socialismo teórico.
Chico – Não, não, por favor! Essas células advogadas pelos anarquistas são quase individuais e sem formar uma pirâmide, ficando só na base, com o fluxo na horizontal. É de organização impossível.

Robson – Não entendi porra nenhuma, acho que ainda não bebi o bastante (risos)
Ana – Me desculpe, mas nem eu, Chico.
Chico – Toda estrutura social é ascendente, começa na base e termina no vértice de uma pirâmide. A base é o povo e aí vêm a hierarquia de poder, as assembleias legislativas, os tribunais, o congresso, até chegar no vértice, no caso brasileiro a Dilma. Sempre foi assim, não importa se no vértice estava um rei, um imperador, um messias, um xamã... Sempre o povo na base e um supremo mandatário no vértice. Os anarquistas acreditam que podem manter uma ordem jurídica, institucional, econômica, política, filosófica... Só com a base, sem a formação da pirâmide. Entenderam, songuinhos? (risos)

Robson – Você não acha que uma sociedade estruturada assim: células de bairro, que elegem membros pra células da cidade; células das cidades, que elegem membros pra célula do município; células dos municípios que elegem membros para uma célula estadual; as células estaduais elegem membros para uma célula nacional. Só que inverte a mão, ao invés das células de baixo estarem subordinadas, elas são sobreordinadas, a hierarquia é invertida.

Marquinhos – Sobreordinadas? O Cara tá tão bebo que tá criando palavra. Baixa o tradutor do Google, Chico.
Chico – Sei não, mas acho que essa palavra existe. É o antônimo de subordinar. Robson, se você trocar a palavra célula por comitê, fechamos. Você acabou de descrever a estrutura de uma democracia socialista, meu chapa. O poder de baixo para cima, exatamente o contrário do que pregam as hipócritas constituições burguesas: “ todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”. Não é “em seu nome”, mas, “por ele será exercido”, nessa estrutura descrita por você.

Robson – Eu sou o cara! Aí... Eu vou te fazer uma pergunta direta e quero que você seja objetivo, sem vaselinagem: você sabe que sou petista, e você bate no PT e depois defende, morde e assopra, qual é a tua?
Ana – Vou aproveitar o gancho do Robson e vou além: pelas tuas postagens e comentários não fica bem clara a tua posição política, abre pra gente.
Chico – Sou de esquerda. Sou socialista. Pra mim o regime ideal é aquele onde ninguém tenha dinheiro bastante para subordinar outro, nem passe necessidade a ponto de ter que se subordinar. Estou falando economicamente, não de estrutura política ou de organização de trabalho, aí é diferente. Minha concepção econômica é marxista, com tudo o que tem direito: conceito de lucro, mais valia, acumulação de capital, fetiche dos objetos,  do dinheiro... Sou marxista e pronto! Acho que já te respondi, Ana.
Agora o Robson: eu nunca fui petista, mas tive sempre ligações muito íntimas com o PT, desde a sua fundação. O PT só é partido de quinze anos para cá, talvez menos, antes era uma frente de partidos, grupos, tendências, facções... Todo mundo que não se enquadrou dentro da estrutura burguesa dos partidos, correu para o PT. Uma coisa que ninguém se toca é que a constituição de oitenta e oito e depois as leis ordinárias que regulamentaram a criação e a estruturação dos partidos políticos praticamente mantiveram o que foi escrito pela ditadura militar. Não é por acaso que voltamos ao bipartidarismo, PT/PSDB, como era MDB/ARENA. Esse é mais um dos motivos de fazermos uma reforma política urgentemente.

Ana – Peraí, Chico, você está subestimando o PMDB, que é o maior partido de todos.
Chico – Em número de filiados e diretórios sim, mas sem força eleitoral nenhuma. Quantos presidentes da república elegeram, desde a sua criação? Nenhum. Quantos governadores? Poucos. É um partido grande porque desaguadouro de tudo que é oportunista, golpista, mercenário...  Faz é vereadores e deputados estaduais, por causa dos caciques, coronéis e votos de cabestro. Aqui no Rio o governador jogou toda a máquina governamental e muita grana para fazer o prefeito da capital. Fez. Qual era a parte do acordo que o prefeito eleito teria que cumprir? Levar o seu peso eleitoral, a máquina administrativa e a grana do orçamento municipal para o PMDB de Sérgio. Levou. Por isso é um partido grande. A filosofia do PMDB é “tem dinheiro? Tô dentro, tem acordo e coligação”, não interessa se o governo é comunista, capitalista, protestante, macumbeiro, islamita, de Deus, do diabo... A grana é a única exigência política (risos). Então pra mim o PMDB não é partido, é sigla de aluguel.

Robson – Não acabou de falar do meu PT.
Chico – Como eu ia dizendo, o PT era uma frente, onde tinha de tudo, desde anarquistas, trotskistas, marxistas leninistas, stalinistas, sociais democratas, porra loucas independentes... E entre todas essas tendências, uma, social democrata com cheiro de neoliberal, chamada de Articulação, que era a que apoiou Lula depois, e da qual ele sempre fez parte, que se tornou majoritária e promoveu um expurgo no partido. Os trotskistas fundaram o PSTU, por exemplo, e por aí foi até de majoritária se tornar praticamente única, e que determina a linha do partido, hoje, e que não é nem nunca foi socialista, é social democrata, eu a conheço desde o berço.

Robson – Então porque esse morde e assopra?
Chico – Vamos olhar o espectro político brasileiro: na extrema direita você tem os ultrarreacionários, a galera que quer a volta dos militares, os homofóbicos, partidários da porrada, os latifundiários, correntes religiosas... Na meia direita você tem o PSDB, cujo sonho é anexar o Brasil aos Estados Unidos, desnacionalizar tudo, só deixando de brasileiro a miséria e a fome. Só são sociais democratas no nome. São neoliberais mesmo. No centro você tem o PMDB, que vai para um lado ou para outro de acordo com as conveniências não do país ou do povo, mas do partido. Na meia esquerda você tem o PT, social democrata, com boa parte dos seus membros namorando o neoliberalismo e uma parte namorando o socialismo, e na esquerda os socialistas e comunistas.
Então como fico? Logo à minha esquerda estão os comunistas. Mais adiante, na esquerda, os radicais de esquerda, utópicos. Todo o resto do espectro está à minha direita, inclusive o PT, então forças a serem combatidas, politicamente, claro. Só que estando na meia esquerda, o PT está muito mais próximo de mim do que as outras forças. Quando a direitaça une forças e bate no PT, está batendo na esquerda, ainda que não da dos meus sonhos, aí me alio temporariamente ao PT. Entre ser mordido pelo Pit Bull do PSDB ou pelo Pincher do PT, prefiro mordida de Pincher. (risos) Bicada de tucano dói mais que picada de estrela. (mais risos)
Entendeu o morde e assopra, Robson? Não é morde e assopra.

Lena – E como você vê esse jogo de forças, hoje, no Brasil?
Chico – A direita está bem forte. Nunca, desde a queda da ditadura, a direita esteve tão forte, por conta dos préstimos da mídia brasileira, vendida ao capital ou ligada a correntes religiosas que são a cara religiosa do capitalismo. Não sou brizolista, nunca fui, mas o velhinho estava certo: “só será possível a democracia no Brasil quando houver o desmonte da Tevê Globo”.

Lena – E o PSDB nisso?
Chico – Lena, o velho Marx afirmou que a história não se repete senão como farsa. Então parece que vivemos uma farsa, hoje, exatamente cinquenta anos depois. Dois mil e treze repete mil novecentos e sessenta e três: a direita assanhada, procurando aliados na sociedade civil e encontrou nos católicos, pediu adesão dos militares e aderiram. O partido de meia direita, a UDN, deu apoio, acreditando que assumiria o poder, com a deposição de Goulart, e que seu prócer, Carlos Lacerda, se tornaria presidente, após a deposição do presidente da república, via golpe.
O que está acontecendo hoje, em 2013? A direita assanhada, procurando aliados na sociedade civil e encontrando, nos protestantes, pedindo a intervenção dos militares. O partido de meia direita, o PSDB, dando apoio, esperando crescer com a derrubada do PT, para fazer do seu prócer, Fernando Henrique Cardoso, o presidente, após um golpe.
Só que estão fazendo uma leitura parcial: após o golpe, no ano seguinte, 64, a UDN, que pretendia crescer, foi destruída pela lei do bipartidarismo, sendo extinta. Lacerda, que se pretendia presidente, foi cassado, e os católicos, que foram para as ruas pedir golpe, viram soldados invadindo as suas igrejas e mosteiros, para prender padres, torturá-los ou induzi-los a suicídio. Tucano, em política, além de ser uma ave de rapina, é uma ave burra.
Claro que num quadro desses, fecho com o PT, com o governo federal, sem contar que se derrubarem a Dilma sem golpe, quem assume é o vice presidente,  Themer, bonequinho de marionetes de Sarney. Quer dizer, Temer no papel e Sarney presidindo de fato. O presidente do Congresso Nacional passa a ser o vice presidente, que é o Renan Calheiros, e o terceiro na hierarquia, o presidente do STF, o Joaquim Barbosa. Aí fudeu. Por mais que os cristãos pintem de ruim o inferno, o inferno brasileiro seria pior. Então apoiar o governo federal nesse momento nos livra de duas alternativas: ver a democracia ir para o cacete ou entregar o país à dupla Sarney, Renan.

Lena – Marquinho está caladinho...
Marcos – Falar o quê? Escutar pra aprender.
Lena – Você pinta o FHC de conservador, e essa proposta de legalização da maconha, dele?
Chico – Primeiro que essa proposta não é dele, é do Gabeira, o FHC, como sempre está gozando com o pau dos outros. Segundo, que não basta você fazer uma proposta, ela tem que vir bem embasada cientifica e filosoficamente, pra se justificar. A argumentação do FHC é única: acabar com o narcotráfico, detonando bandidos e a banda podre da polícia. Isso basta pra justificar? Não. Legalizando, qual é a diferença entre o meu filho comprar cocaína na boca de fumo ou na padaria da esquina? Qual é  opinião dos médicos e bioquímicos? Não sei. Qual seriam os benefícios de uma sociedade licitamente drogada? Não sei, não ouvi teóricos: sociólogos, antropólogos.

Ana – Você falou que FHC é useiro e viseiro em roubar ideias...
Chico – Se eu perguntar a mil brasileiros quem é o pai do Plano Real, 999 vão responder que FHC. Esse foi o maior estelionato eleitoral da história do Brasil. Posso te dizer de cadeira. Nessa época eu presidia o sindicato. Sabe qual? Dos estatísticos do IBGE, portanto as coisas aconteceram debaixo do meu nariz. Nos grupos de poetas do face tem pelo menos 3 funcionários do IBGE e te confirmam isso. FHC não é economista, não manja nada de economia, por isso nunca participou de uma reunião da equipe econômica, fosse no Ministério da Fazenda, no Banco Central, IBGE... Em lugar nenhum. Ele era na verdade um articulador político de Itamar Franco. Quem trazia as rédeas na mão e é o verdadeiro pai do Real é o Rúben Ricúpero, este sim, que trabalhou o tempo todo.
Ah! Mas foi FHC que assinou o Plano, na sua publicação, e assinou na nova moeda. Indevidamente, uma fraude. As eleições presidenciais seriam, como foram, em outubro. Por causa da lei da desincompatibilização, FHC saiu do ministério em março, o Plano real é de junho, ele já estava fora. Itamar o chamou pra dar uma força na campanha presidencial, porque Lula estava forte, e ele assinou no lugar do Ricúpero. Ah! Mas o plano é do PSDB! Mentira, Itamar Franco, o presidente, era do PMDB. Que credibilidade tem o PSDB e a tucanada toda, a começar por FHC?
Uma das promessas de campanha de FHC, na reeleição, é que ao final do seu governo o salário mínimo estaria em 100 dólares, duzentos reais, hoje. O salário mínimo já ultrapassou trezentos e cinquenta dólares hoje. FHC tomou posse da oitava economia do mundo, passou para o Lula, oito anos depois, a décima sexta economia do mundo. Hoje, onze anos depois, voltou a ser a sexta. Quem vota no PSDB ou é estupidamente burro, ou é masoquista ou rouba junto.

Marcos – Chico, vou te fazer uma pergunta muito delicada e gostaria que você respondesse com sinceridade mesmo, porque é a única coisa em você que incomoda a muita gente, tanto no face quanto no rádio, e acredito que até na sua vida pessoal. Você parece ter aversão aos evangélicos, você bate muito. Por quê?
Chico – (demora a responder, pensando, muito sério) É, eu tenho que explicar bem explicadinho, e foi bom você perguntar isso. Eu não tenho aversão a evangélicos. Tenho aversão à prepotência, a suposição de ser dono da verdade, e com isso perpetuar um passado indesejado, indesejável, seja evangélico, político de direita, católico conservador, espírita alienado. Só que, por ter investido muito dízimo nos veículos de comunicação, os protestantes ganharam muito poder de persuasão. O desserviço político da Globo é o mesmo da Record. Uma mente pra gente não agir, a outra convence que não devemos agir. Por coerência, bato nas duas.
Primeiro vamos dar nome certo aos bois: evangélicos são todos aqueles que estudam o evangelho, que pautam a suas vidas pelo evangelho. Católicos, espíritas, protestantes das diversas denominações são evangélicos. Cristão também não define. Católicos, kardecistas, protestantes, mórmons, adventistas... São todos cristãos, seguem os ensinamentos de Cristo, independente da interpretação que tenham.
Então usemos o termo protestante, que é o que define. Todo protestante é evangélico e cristão, mas nem todo cristão e evangélico é protestante. O primeiro sintoma da prepotência, da certeza de ser dono da verdade, de discriminação, é a apropriação de termos e conceitos.  Na ditadura os caras diziam que não faziam eleições por causa do risco para a democracia.
Um outro sintoma de prepotência, de ser dono da verdade, é transformar predicado e objeto em sujeito. Na ditadura criticar o ditador era criticar o Brasil. Quando as críticas se acirraram, por conta da tortura e da censura, da violência nas ruas, praticada pelos militares, o slogan usado em plásticos, nos carros, out doors, alardeado pela Globo, prostituta que se vende a quem estiver no poder, era “Brasil, Ame-o ou Deixe-o”. Quer dizer, ao invés de dizerem “ditadura, se submeta ou fuja” diziam serem eles o Brasil. Então com o irracional religioso é a mesma coisa: dar uma porrada num protestante é bater em Deus. Criticar a religião, uma instituição humana, como a Igreja Católica, a macumba da esquina... É criticar Deus.
Essas são as minhas primeiras críticas. À prepotência, a discriminação em relação ao resto da humanidade, não convertida.
A segunda divergência é política. Todo sistema econômico tem faces. Como a economia determina todo o resto, o modo de produção de bens condiciona o modo de produção de ideias, e consequentemente, a arte, a filosofia e a religião. Cada época teve as suas faces.
Vamos examinar o feudalismo. O modo de produção era a partilha do produto do trabalho com o dono da terra, o que implicava em subordinação incondicional do trabalhador (vassalo) ao senhor (feudal), para não perder a fonte do seu trabalho (a terra). Isso levou a uma cultura espelho, reflexo exato disso. O suporte religioso foi a igreja católica, ela mesma senhora feudal. Subordinação total ao Papa, intermediário entre o Homem e Deus, submissão do vassalo ao senhor porque isso era bíblico, recusa a priori de qualquer informação que pudesse abalar o sistema, o que passava pela recusa sistemática a novas descobertas (Galileu e Giordano Bruno que o digam), artes postas como busca ou glorificação de Deus (e aqui foi bom: Mozart, Bach, Haendel, Mendelson, Gonot, Schubert...).
Ora, combater o feudalismo, naquela época, era combater todas as suas manifestações, as suas ferramentas de perpetuação, que o digam os Iluministas, a começar por Voltaire, que porraram a religião, ferramenta principal porque estribo, rédeas, antolhos.
Hoje temos o capitalismo, e combatê-lo é atacá-lo em todas as frentes: politicamente, mostrando o que se esconde por trás do conservadorismo, desmascarando a direita, apontando as contradições entre as pregações e a prática. Moralmente mostrando a corrupção, os desvios, os cabides de empregos, o tráfico de influências... Economicamente apontando a dependência externa, as privatizações, a concentração de renda, os favores, através das concessões, incentivos e isenções fiscais... No campo ideológico mostrar que a produção artística é superficial, mercantil, descartável, mais preocupada com o mercado do que com a exteriorização do que vai no homem... E no campo religioso, apontando na religião suporte do sistema tudo o que disse anteriormente, presente nela.
Se você ficar só num ou nuns pontos, você vira reformista. Pra mudar tem que mudar tudo, senão não é mudança, é reforma. Então tem que passar pela religião também.

Marcos – Então tá, meu guru. Mostra presente nela, então.
Lena – Se fizer um exame de sangue agora, o soro vai ser etílico.
Chico – O laudo vai ser álcool etílico com vestígios de sangue (risos). Esse cara não vai sair daqui dirigindo não, que não vou deixar (Marcos faz sinal de positivo, já embriagado)
Robson – Chico, em cima do que esse bebum falou (risos), eu quero exemplos concretos, prova o que disse com exemplos concretos, está muito solto.
Chico – Tá. Vou te dar um exemplo bem concreto. Qual é a razão de ser do capitalismo? O nome já está dizendo, gerar capital, multiplicar dinheiro. No capitalismo tudo é meio de produzir dinheiro, outra coisa qualquer não faz sentido.
O dono de uma fábrica de camisas, por exemplo, não coloca camisas no mercado porque gosta, a camisa é uma mercadoria que ele vai trocar por dinheiro, então a camisa é um meio, as máquinas são um meio, os operários são um meio, porque o fim é a produção de capital. Ele produz camisas como produziria cuecas, dinamite, maconha ou inseticida, não faz diferença, porque é tudo mercadoria para ser trocada por dinheiro. Assim funciona o capitalismo, tudo subordinado ao dinheiro, inclusive o ser humano. Entendido?
Conheci um cara que aos treze anos foi embora de casa para ser músico profissional, na época da Jovem Guarda. Com 14 anos já estava amasiado com a dona de um puteiro, experimentou de tudo, largadão do mundo, sozinho, longe da família. Dono de um talento inato terrível para a música, logo estava tocando uma série de instrumentos musicais. Por conta própria foi estudando composição, harmonia, fazendo experimentos... Com 17 anos engravidou uma menina e se casou, abandonando aquela vida e se tornando chefe de família, usando a música como usamos a literatura, sem fins lucrativos imediatos. Prestou concurso para um órgão público e passou. Acabou meu aluno, para concluir o ensino médio, entrou para a faculdade, formando-se em Português/Literatura. Passou a acumular o emprego público com aulas de português  e aulas de música.
Nessa época eu era espírita praticante, e me preocupou a situação daquele cara, trabalhador pra cacete, um senhor talento, fazendo arranjos, regendo coral... Pra vocês terem uma ideia, assim como pegamos papel e lápis e escrevemos a letra de uma música, ouvindo-a, ele pega lápis e partitura e escreve a música, diretamente, como se o sons fossem palavras, um puta talento, mas meio perdido de ideias, com a vida sem fazer sentido, essas coisas.
Convidei-o para ir ao Centro que eu frequentava, um Centro Kardecista, e ele gostou e ficou frequentando, passando a exercer atividades outras no próprio Centro, durante muitos anos.
Aposentou-se do serviço público e também abandonou o magistério, indo dedicar-se à caridade, principiando por se tornar padeiro num asilo de velhos, sem remuneração, claro. Depois começou a criar corais com jovens, para arranjar ocupação para eles, e para a terceira idade, sem remuneração. Mas ainda sobrava tempo de madrugada, e ele passou a percorrer as ruas, para conversar com meninos drogados.
Pelo que me contou: boa noite, meu amigo. Não está com frio? Você deve estar com fome, me acompanha que você vai comer. E levava para o Centro, onde serviam um sopão de madrugada, para os que eles recolhiam nas ruas. E começava o papo: eu sei do que você faz, porque já fiz muito. Não vou falar pra você largar as drogas porque eu ficava chateado quando falavam isso comigo. Só larguei quando eu quis. Pode ficar tranquilo. E pegava um violão e começava a dedilhar, perguntava se o moleque sabia cantar, acompanhava. Depois passava o violão pro moleque, mostrava uma ou duas notas, o moleque aprendia e no dia seguinte voltava para o sopão e o violão, depois o coral, a evangelização e o fim do vício e das ruas. Foram e continua sendo muitos.
Muito bem. O que pensam os protestantes disso? Segundo eles, o que ele faz não tem valor, porque “a obra sem fé é morta”. Mas como sem fé? Ele prega o evangelho, estuda o evangelho, é cristão, não bebe, não fuma, não adultera, pratica a caridade, faz o culto do Evangelho no lar. Aí os evangélicos retrucam: “mas não aceitou Jesus”.
Por aceitar Jesus entenda-se tornar-se protestante, porque Jesus só está lá, e em nenhum outro lugar.
Para religiosos está tudo explicado, para o leigo está tudo explicado. Mas para quem tem um olho em terra de cegos, há muito por trás: porque a obra espírita não tem valor? Porque ela não gera dinheiro. Pelo contrário, os espíritas tiram dinheiro do próprio bolso, para ajudar, e isso numa estrutura capitalista é um sacrilégio. O espírita tem o homem como o fim e isso numa estrutura capitalista é um sacrilégio. O fim tem que ser o dinheiro.
O certo, para ele ganhar a salvação, seria se tornar protestante, dar o dízimo, fazer ofertas, comprar livros e discos gospel, de maneira que a sua fé fosse geradora de capital, que passasse a ser um meio. Esse dinheiro nascido da fé dele iria comprar canais de televisão, sítios para retiro espirituais, pagos, lógico, pelos usuários, aviões, carros, imóveis onde funcionam as igrejas, imóveis outros, como investimento, gravadoras de discos, editoras... Tudo para Jesus, que é a mercadoria chefe do mercado gospel.
Você sabia que pastores cobram cachê para pregar em outra igreja? Que esses cantores gospel cantam nas igrejas através de contratos, ou em grana viva ou em cedês vendidos? Se não conseguir vender a quantidade estipulada no contrato, a igreja tem que cobrir  diferença.
Ora, mulher que me ama porque me ama é mulher que me ama. Mulher que me ama porque é remunerada para amar é prostituta. Louvar com cachê senão não louva?
Respondi, Robson?
Robson – Posso te dar um beijão?
Chico – Entenderam a minha posição? Se tenho o capitalismo como um inimigo do homem, tenho que atacá-lo em todas as trincheiras, inclusive religiosas, talvez as mais difíceis de serem vencidas. É mais fácil você expropriar uma fábrica do que mudar a cabeça de um fanático robotizado por doutrinas.

Ana – E como fica Deus, Jesus, nessa história. São males a serem combatidos?
Chico – Não, claro que não. Quer ver uma coisa? (Chico sai e logo volta, com uma Bíblia na mão). Olha a dedicatória e a data. Foram os meus avós que me deram, compraram em Aparecida do Norte, a décadas atrás, é o meu livro de cabeceira. Olha como está velhinha de manuseio. Eu a leio. Só que Deus me deu dois olhos e um cérebro perfeitamente funcionais, não preciso de padre nem pastor para me explicarem o que estou lendo. Surpreenderam-se? (risos meio desnorteados) Se eu comer uma mulher hoje porque tenho que anunciar no face amanhã, comentar na escola? Se eu orar hoje porque tenho que alardear isso? Problema meu.
Porque peguei a Bíblia? Para mostrar que também tenho fé. Vocês nunca leram um poema meu, ou um conto, questionando, depreciando ou zombando de divindades, seja Jesus, Deus, Espírito Santo, Orixás, Buda, santos católicos... Ou porque eu creio em alguns ou porque respeito os que cultuam os que não cultuo. Entenderam agora?
A minha diferença não é com as divindades, é com as instituições.
A Igreja Católica começou com Constantino e o Protestantismo, com Lutero. Deus não criou religiões. São instituições humanas.
Vivemos num planeta onde fazemos guerras, nos matamos por nada, cometemos assassinatos, pedofilia, roubamos, depredamos o meio ambiente, somos corruptos, nos exploramos, deixamos morrer de fome... Uma pocilga. É claro que todas as atividades humanas refletem isso: a política, a economia, a filosofia, as artes e obviamente, as religiões. Porque ficariam de fora? Somos primitivos, os últimos animais a terem surgido, na escala zoológica. Somos uma espécie muito nova, ainda temos muito para evoluir.
Lembra da pirâmide, que citei a pouco? Aquilo vale para sistemas políticos e econômicos, para a estruturação das sociedades, demografiame

Ana – Chico, em conversa no chat você me fez umas afirmações que achei interessantes, sobre a possibilidade de vida extraterrena. Coloca aí pra eles.
Chico – Antes uma coisa que está me incomodando. O cara vai ficar chateado comigo, mas é uma questão de justiça: o espírita que citei como exemplo, o músico, é meu irmão, a quem amo e admiro muito (Chico principia a chorar e interrompemos novamente)

Lena – Você é emotividade pura, cara!
Chico – Sorrio e choro com extrema facilidade, e não tenho controle. Lembrando pessoas,  lendo os poemas dos amigos, relendo um poema meu, ouvindo o Hino Nacional, de cenas de novela, gente caracterizada de palhaço, algumas músicas... Sou chorão inveterado. (ele sorri)

Ana – Voltando ao chat, vida extraterrena.
Chico – A lei principal da natureza é a da otimização dos processos, de maneira a não haver sobras, mas equilíbrio. Quer dizer, a lei da eficiência. E a da Biologia, a da ocupação: onde houver a menor possibilidade de vida, haverá.
Converse com um bom médico e ele vai lhe falar dos parâmetros em que ocorrem as reações bioquímicas em nosso organismo, em máxima eficiência, de maneira equilibrada, ordenada, por etapas, e assim é em toda a natureza. Um ecossistema também funciona assim, sem sobras nem faltas, reciclando permanentemente, para o equilíbrio ser mantido.
Isso mostra pra gente o absurdo do capitalismo, que é o único sistema que foge à regra: busca o desequilíbrio, a não reciclagem, o descarte e a sobra. O capitalismo é antinatural.
Se as colmeias, colônias de cupins ou de formigas funcionassem como nós, no nosso sistema, se tornariam espécies inviáveis, como nos tornaremos, se não mudarmos.
Ora, essa regra não é terrena, mas como todas as lei naturais, universal, o que subordina bilhões de sistemas solares e bilhões de planetas a isso, criando a possibilidade de vida, da mesma maneira que foi criada aqui.
A segunda lei, a da ocupação: em nosso planeta você encontra vida nos locais e sob condições que contrariam todas as expectativas:  no lençol freático, onde nunca entrou um único raio de sol, nas profundezas oceânicas, onde também nunca entrou um único raio de sol e onde a pressão é equivalente a cada ser humano transportar um Everest sobre a cabeça. Aí você me pergunta: como pode? No fundo do oceano, nesses lugares, há minivulcões, com crateras de milímetros, de onde jorram gases sulfurosos, permanentemente, e calor. Os seres daí vivem desse calor e metabolizam a partir do enxofre, e não do carbono, como nós. Não são só protistas e bactérias. Aí você tem vermes e celenterados, que já estão muito próximos dos vertebrados, na escala evolutiva. Você tem vida nos deserto mais áridos, nos polos, e já foram encontradas bactérias nas últimas camadas da atmosfera, já sem gravidade e oxigênio, e bombardeadas por raios cósmicos teoricamente letais. Você tem micróbios que metabolizam a partir do Arsênio, elemento letal para a vida, você tem micróbios anaeróbios, que morrem na presença do Oxigênio, na contramão da vida como a concebemos, o que abre infinitas possibilidades de vida extraterrena. Um detalhe: já foram encontrados meteoros com estruturas de proteínas fossilizadas. Não se conhece na natureza nenhuma proteína que não tenha sido produzida por um organismo vivo.
Olhando o tamanho do Universo e conhecendo um pouquinho das leis naturais, não posso admitir o vazio. Se perguntarmos a um religioso do porque dessa contradição de Deus, de fazer um Universo imenso e só povoar aqui, ele vai dizer “para a própria graça”, como dizem em relação  tudo o que não entendem, e o para a própria graça vai me soar como “por vaidade”, o que é incompatível com os atributos divinos.
Eu nasci com algumas verdades instintivas que, quando me ensinaram na escola, só confirmaram as minhas desconfianças, e uma delas era de que cada estrela era um sistema planetário similar ao sol, que a natureza se repete em todos os rincões do Universo, de maneira variada, sob as condições locais.
Vivi frustrado diante da afirmação científica de que, pelas distâncias e tamanhos dos planetas, jamais poderiam ser detectados.
Quando foi noticiada a existência do primeiro exoplaneta, que são planetas que orbitam estrelas outras que não o sol, não me surpreendi, me encantei, diante da confirmação do esperado por mim. A NASA já identificou mais de dez mil exoplanetas, e agora tudo o que eu desejaria ver antes de morrer é o homem encontrar vida fora da Terra, uma bactéria ou um vírus, que seja, o que confirmaria que o Universo é um grande jardim vivo.
Pelas leis da evolução, se há bactéria, onde houve condições e tempo, evoluiu para seres superiores.
É provável que um dia, em alguma praia da América dois índios tenham discutido sobre a possibilidade de existir homens do outro lado do oceano, o que contrariava o bom senso deles, os dogmas religiosos deles, as expectativas deles, a acomodação existencial deles... Até que chegou a primeira caravela.
Estamos na mesma situação deles, só que diante do Cosmos infinito.

Robson – Se eu fosse mulher já tinha dado pra você.
Ana – (rindo muito) Tuas aulas devem ser show.
Chico – Agradam,  dão audiência (risos) Vê porque dizem que os dos bêbado não têm dono? Basta umas caipirinhas e eles se afelicianam.

Lena – (rindo) Adorei o neologismo, o verbo afelicianar como sinônimo de aviadar, vou usá-lo a partir de agora, posso?
Chico – Pode. Você pode tudo, Aninha.
Ana – Chico, qual é a sua posição religiosa, mas não defina em uma ou duas palavras, explica pra gente.
Chico – Eu sou livre pensador cristão. Sou de berço católico. Tenho todos os sacramentos, exceto a ordenação e a extremunção, claro. Meu avô foi seminarista, um dos meus irmão foi seminarista, fui coroinha, ajudei nas missas, e encarei uma pressão muito grande dos meus parentes, para que eu me tornasse padre. Acho missa um negócio meio estafante, mas amo os outros rituais, acompanhei muita procissão, fiz muita bandeirinha, para decorar as ruas e isso me dava muito orgulho. Amo de paixão a música sacra, principalmente os cantos gregorianos e o som do órgão. Já fui a muitos casamentos de desconhecidos, principalmente na Candelária e na Catedral Presbiteriana, na Praça Tiradentes, só para ouvir o órgão. E nos rituais católicos não fico só no visual, consigo perceber o clima místico que há por trás, me sinto bem.
Só que, acredito, a minha maior característica é a curiosidade e o questionamento, e logo me vi devorando livros de outras religiões, muita coisa do misticismo oriental, do esoterismo, e incorporei muitos conceitos, crenças e possibilidades ao modelo católico que eu tinha.
Veio a militância política e tive contato com o materialismo. A princípio com o materialismo mecanicista, depois, por leitura e discussões, com o materialismo dialético mesmo, que fez sentido, e fiquei totalmente materialista.
Só que a dialética descreve os processos, o como, mas não o porque, e tive que, por exigência intelectual, reintroduzir a possibilidade de uma inteligência superior por trás, quer dizer, o conceito de Deus deixou de ser uma questão de fé, mas uma necessidade racional, intelectual.
A minha crença na existência de Deus não é questão de fé, é racional.
Hoje sou aberto a todas as concepções religiosas. Ocasionalmente vou à missa. Tenho dois filhos protestantes. Vou ao culto com um deles, quando me chama. Não vou com minha filha porque ela é da Universal, aí é muito (risos), se me chamarem vou à macumba, ocasionalmente vou a centros Kardecistas, que gosto muito.
Levo muito a sério o versículo que diz “Onde dois ou mais se reunirem em meu nome lá estarei”, e ponto final. Não foi dito lá estarei, na igreja católica; lá estarei, na igreja protestante; lá estarei, na macumba. Até por ser escritor, sei que o ponto final finaliza a afirmação, não se segue a contração da preposição com o artigo, o na.
Hoje só vejo um Deus imenso e maravilhoso, uma estrela, a maior de todas, lançando raios de luz sobre todas as religiões, crenças nossas, de crianças em evolução.

Ana – Chico, já anoiteceu, temos que ir, e esses malucos já estão porrados... Vamos parar.
Robson – Tô em êxtase! (risos)
Lena – O combinado foi conversarmos sobre o face, acabou desviando. Vamos terminar falando do face. Fale o máximo possível dos grupos de poetas.
Chico – A Letícia ficou quietinha o tempo todo, quase não falou, não bebeu, não comeu. Está apaixonada? (risos)
Letícia – Prestando a atenção, uma tarde coversando com você é um período de faculdade.
Chico – Boba! Ana, o face repete o mundo real, e não poderia ser de outra maneira, são seres humanos que estão por trás dos teclados. Você tem poetas excelentes, que deveriam estar no mercado, vendendo livros a rodo, não fosse a sociedade tão utilitarista, tão mercantilista.
Tem poetas razoáveis e tem maus poetas bem intencionados.
O maior defeito na maioria dos poetas? Falta de cultura, de informações, repetem-se, com pequenas variações, na superfície da poesia, não mergulham, embora sejam inspirados, tenham talento.
E há os não poetas, sem o menor talento, e que estão ali por gostarem muito de poesia, normalmente compilando poemas de outros autores e postando. São muito importantes, por passarem informações e fornecerem material para os interessados em melhorar a própria poesia.
E há os vaidosos, que nos marcam nas fotos: “a lagartixa é um passarinho/bonitinho/blau blau/vou domir” e, por ser gostosa, um monte de tolos curtem e comentam: lindo, boa noite minha querida, genial, você cada vez melhor... (risos muitos)
Há também os de mau caráter, que plagiam e se apropriam da obra alheia; os que estão ali só para caçar mulheres, ou homens, porque também sou cutucado por machos, affffffff, (risos) e os bobos alegres, que caíram ali e não sabem o que estão fazendo, perdidos.
Mas peneirando, tem gente excelente. No estilo, na cultura, na técnica e na inspiração, gente muito boa mesmo.

Ana – Tem um grupo que te isolou. Você se sente vítima de preconceito?
Chico – Deixa eu contar a história, pro pessoal entender. Tem um grupo de pessoas, alguns não escrevem poemas, têm é alto senso crítico, a maioria de portugueses, que tenho como pessoas cultas, com muita informação, e que escrevem muito bem. Eles não postam nos grupos. Postam entre eles, marcando-se reciprocamente nas fotos.
Então em tudo o que postavam me marcavam, e eu gostava muito, por causa do alto nível deles, como falei.
Entre eles há uma senhora, portuguesa, que é a melhor prosadora entre nós, disparadamente, a quem, inclusive, dediquei um poema, por isso.
Pois bem, esta senhora postou um texto maravilhoso, tecnicamente falando, criticando a tortura que os poetas fazem com a língua portuguesa, nos grupos, com o que concordo, e me marcou na foto.
Comentei, elogiando a redação, o estilo, ótimo, como sempre, e concordando com  a argumentação, que a maioria dos que escrevem são instintivos, não têm nenhum conhecimento do que fazem.
Só que seguiram-se dezenas de comentários preconceituosos, de ataque mesmo, de desprezo aos poetas menos cultos, e voltei a comentar, defendendo os poetas dos grupos, muitos deles meus amigos, e taxando-os de elitistas e preconceituosos.
No dia seguinte postei um longo poema em que afirmei que para justificar a exploração do homem pelo homem nos dividiram entre senhores e escravos, depois entre cristãos e bárbaros, entre brancos e negros, arianos e não arianos e agora queriam justificar a exploração do homem pelo homem nos dividindo entre letrados e iletrados, cultos e ignaros, que essa era mais uma máscara de justificação da divisão em classes e da exploração. Nunca mais me marcaram nas fotos deles.
Mas me leem, continuam lendo, porque vejo influência dos meus texto nos deles, tanto quanto eles veem influência deles nos meus.

Lena – O que você acha disso?
Chico – Olha, eu curto e comento poemas. Diante de um bom poema, independente de quem o tenha escrito, se meu amigo ou não, se alguém de quem eu não goste ou que não goste de mim, seja pelo que escrevemos ou pelas posições políticas e religiosas manifestadas, curto e comento.
Se o poema não tem identificação comigo, independente de quem tenha escrito, se o Papa  ou minha mãe, passo batido, não termino nem de ler, não curto nem comento.
Não curto nem comento pessoas. Meu negócio é poesia. Curtir para agradar é ser hipócrita. Deixar de curtir o que merece ser curtido, como forma de vingança, é mesquinharia, coisa de espírito pequeno.
Espero que lendo isso muitos amigos parem de me cobrar comentários. Continuo curtindo-os de paixão, mas os poemas deles... Só quando merecem.

Ana – Vamos parar, Chico. Vou transcrever agora, logo que chegar em casa, a Lena e a Letícia vão me ajudar, pra ver se dá tempo de você postar amanhã. Mando por e-mail. O nosso acordo foi de que você não mexeria em nada, certo?
Chico – Certo, embora eu gostasse de tirar esses elogios piegas, despropositados, de pura amizade.
Ana – Não vai tirar nada. Quero terminar dando um depoimento, já que o Chico é lido em diversos países: imaginem-no no fogão, fritando salgadinhos para nós, sentado no chão, despenteado... No início ele nos deu boas vindas ao seu barraco, o que se aproxima muito da verdade, ele só tem o essencial, numa casa muito pequena, apesar de ser empresário bem sucedido, tem uma escola de porte razoável. Está rindo de que?
Chico – Bondade e exagero seu. Lembrei-me de que as pessoas chegam aqui procurando o professor e quando digo pode falar, ficam surpresas, ou então pedem para eu chamar o patrão (risos)
Ana – Você é muito simples!
Chico – Olha o meu carro. É o único carro no Brasil que tem um jardim dentro.
Ana – Aquele golzinho?
Chico – É. Eu transporto a alimentação dos animais, quando vou comprar, e cai dos sacos: alpiste, girassol... O carro fechado... Aí, por causa da temperatura e da umidade, quando fecho o carro, funciona como uma estufa, aí as sementes brotam, e deixo, vem ver!
Ana – Pqp, é verdade! Você é muito doido! Já que você falou nas plantas. Teu sítio é maravilhoso, natureza por todos os lados. Obrigado pelo papo, Chico, aprendemos muito, acho que vai agradar aos seus leitores, que são muitos, merecidamente, você sabe, parabéns por essa sua humildade...
Chico – Ei! Eu não sou humilde. Se eu morasse numa mansão e você elogiasse, não me alteraria em nada, se ao invés daquele golzinho fosse um vectra todo equipado, como era o carro anterior, e você elogiasse, ou dissesse que sou um homem bonito, que estou bem vestido... Nada disso me atinge. Agora, se elogiar um quadro meu, um poema que escrevi, uma planta que cultivei... Aí me derreto. Eu sou muito vaidoso, não tenho nada de humilde, só que é um outro tipo de vaidade, não tem nada a ver com matéria, com objetos. Daqui a pouco vocês pedem a minha canonização (risos). Como na canção, sou só um moço velho que já viveu muito.

Ana – Obrigado, Chico. Em meu nome, da Lena, da Leticia, desses cachaceiros e, tenho certeza, em nome de todos os que vão ler.
Chico – Valeu.


FIM

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